Seja branco, cometa um crime e será tratado como um ‘superstar’ no paddock

(Foto: LAT Images)

O privilégio branco é como a alta prateleira de um supermercado, mesmo a marca tendo as piores atitudes possíveis sempre terão a atenção dos holofotes

W.E.B Du Bois, ativista norte-americano pelos direitos civis e pan-africanista, publicou um estudo nos anos 1930 sobre o privilégio branco. Nele, mostrava que os trabalhadores brancos tinha um status especial, que dividia o movimento trabalhista, levando-os a se sentirem superiores aos trabalhadores negros, mesmo com os baixos salários.

Até hoje, temos essa questão da branquitude em nossa sociedade, e na Fórmula 1 não é diferente. Apenas veja como tratam um grupo de pessoas brancas quando cometem crimes.

Recentemente, o caso de Christian Horner tomou conta dos assuntos mais comentados da categoria. O britânico foi alvo de investigações após denúncias de uma funcionária da equipe, que alegou ter sido assediada sexualmente pelo chefe da Red Bull. O dirigente teria enviado mensagens com cunho sexual por um grande período de tempo.

No entanto, após investigações, a equipe austríaca concluiu a denúncia contra Horner, consequentemente, não foi punido. Mesmo assim, a escuderia deixou claro em um relatório enviado à imprensa, no final de fevereiro, que a vítima responsável pela denúncia ainda poderá recorrer.

A atitude da RBR gerou diversas opiniões nas redes sociais, principalmente de como a equipe agiu nesta ocasião, já que em nenhum momento das investigações, afastou Christian de seu cargo. Enquanto isso, na quinta-feira (7), segundo a imprensa britânica, e relatado pelo jornalista da Band, Felipe Kieling, a vítima foi suspensa do cargo. Ainda de acordo com o correspondente brasileiro, o pedido de suspensão da funcionária teria sido um pedido da esposa de Horner, Geri Halliwell.

Por essas atitudes, podemos ver como a figura do homem branco é privilegiada na sociedade. Se fosse uma pessoa negra nesta posição, com certeza perderia a função na equipe ou seria proibida de estar no ambiente da categoria.

Outra questão que chamou a atenção de todos que acompanham o esporte, foi a forma que o chefe da Red Bull foi abordado quando chegou ao paddock do GP do Bahrein. Ao lado de sua esposa, houve a presença de várias câmeras e flashes no local, como se fosse um “superstar”, que havia acabado de estrear um filme ou lançar um álbum.

Geri e Horner durante o final de semana no Bahrein (Foto: Getty Images)

Segundo os jornalistas que estavam no local, pessoas estavam gritando o nome da Ginger Spice, assim como faziam ao final dos anos 90, quando a britânica cantava no grupo “Spice Girls”. 

Um exemplo disso é sobre Kankamol Albon, mãe de Alexander Albon, que segundo o jornal “The Mirror”, ficou presa por 6 anos na Inglaterra por fraude em um esquema de pirâmide em vendas de carros de luxo. Devido a isso, a tailandesa ficou por muito tempo sem poder pisar no paddock da F1.

Em compensação, temos o caso de Jos Verstappen – pai de Max Verstappen –  que em 2012, segundo o jornal “De Standaard”, agrediu a ex-namorada. A vítima chegou a dar uma entrevista à rede de televisão holandesa RTL, que não foi a primeira vez que presenciou tal atitude por parte do ex-piloto. Após a declaração, a mulher que na época tinha 24 anos, disse que procuraria se esconder após as alegações contra o holandês.

E a lista de agressões de Jos não param por aí. Em 2008, o ex-piloto foi multado e condenado a três meses de prisão após um caso de assalto envolvendo sua ex-esposa, no entanto, teve a pena suspensa. E dez anos antes, Verstappen também foi condenado por agressão, depois de fraturar o crânio de um homem em uma pista de kart.

Mesmo com esses crimes, o holandês não foi proibido de entrar no paddock e nem de acompanhar a dominância de seu filho na F1, mostrando-se presente em todos os momentos do tricampeão na categoria.

Os exemplos dados nos parágrafos anteriores, mostram como a pesquisa da professora norte-americana e uma das pioneira da “Teoria Racial Crítica”, Cheryl Harris – dona do livro “Whiteness as Property” (tradução: Brancura como propriedade) – tem grande correlação com os fatos. 

De acordo com este estudo, as pessoas brancas confiam nesses benefícios, a ponto de suas expectativas influenciarem a interpretação de nossas leis. Sendo assim, esses tais privilégios são negados a pessoas não-brancas.

O privilégio branco paira pela nossa sociedade há anos, e mesmo que as pessoas insistam,  neguem sua existência ou dizem que esse assunto não deve ser misturado com esportes, questões sociais sempre andaram lado a lado. 

Homens como Jos e Horner sempre irão desfrutar de seu privilégio quando necessário, e como o estudo de Du Bois, estarão na primeira prateleira social. Podem cometer crimes tranquilamente, andar pelo paddock normalmente, já que quando pisarem no autódromo, serão tratados como estrelas.

____________________________

Joyce Rodrigues é uma carioca de 20 anos, que está cursando o terceiro período de jornalismo. Ama escrever sobre esportes. A Fórmula 1 é uma das suas maiores paixões desde os seus 14 anos.

Deixe um comentário