Autodestruição pela não manutenção da sujeição na F1


Movimento de sujeição ou conquista de Fanon e Hamilton
(Foto: Getty Images)

O que necessariamente é visto como auto sabotagem? Lewis Hamilton se posicionar a respeito da violência policial contra pessoas pretas? Charles Leclerc evitar um posicionamento sobre racismo por desejar um afastamento de questões políticas? Max Verstappen justificar o racismo de Nelson Piquet com “ele é um cara legal”?

Normalmente, ao alcançar o sucesso, as pessoas evitam agir de maneira autodestrutiva, distanciando-se do que pode agir como sabotagem – essa seria a lógica, como um livro de regras que explicita em total ênfase algo óbvio. Ao dedicar essa tese aos pilotos de F1, é necessário compreender onde a palavra autodestruição faz sentido, como ela afeta alguns exemplos com suas determinadas diferenças.

Frantz Fanon, filósofo e psiquiatra político, afirma que o homem é movimento em direção ao mundo e ao seu semelhante, sendo este movimento de agressividade, que gera a sujeição ou a conquista. Logo, é possível perceber que de primeira não é importante o que foi dito ou feito pelos pilotos ao assumirem uma postura, mas o fato de que uma ação aconteceu. Positiva ou negativa, a ação sofre críticas e julgamentos em escala global.

O movimento citado por Fanon, pode ser exemplificado pelos protestos do piloto 44 da Mercedes na temporada de 2020 e 2021, quando vestia camisetas com frases e argumentava com a mídia sobre seus posicionamentos, cobrando diversidade e inclusão e não medindo suas palavras pela primeira vez em anos.

Em meio a um esporte dominado por brancos como é a F1, os ataques racistas a Hamilton sempre existiram, havendo cascas de bananas atiradas em sua direção em seus primeiros anos na categoria. E após anos de silenciamento, o único homem negro do esporte construiu sua confiança para denunciar o sistema.

Ao citar sujeição, que pode ser vista como uma espécie de submissão, enquadra pilotos que escolhem permanecer neutros, imunes a mudanças no sistema.

Já essa ideia é perceptível em pilotos como Charles e Max, citados anteriormente, que buscam o não-falar como forma de resposta mas no final, ainda assim estão respondendo. É importante frisar que o não posicionamento também é um posicionamento.

Então, a auto sabotagem também é associada a eles? Aqueles que se afastam da divulgação de suas ideias e opiniões sobre as questões sociais? Em algum momento, a falta de atitude será lembrada, marcada como covardia ou apenas liberdade de expressão.

Mesmo em meio a neutralidade, há a reação daqueles que insistem em que nada realmente está acontecendo. Neste caso, não se trata de uma genuína falta de conhecimento mas sim da ignorância.

Bubba Wallace, um dos pilotos afro-americanos de maior sucesso da NASCAR, é um exemplo, assim como Hamilton, do que é enfrentar o sistema e sofrer do que chamam de autodestruição no pico do sucesso.

Quando o norte-americano pede pelo sumiço das bandeiras dos Estados Confederados dos autódromos, alegando a péssima sensação que aquilo causava em pessoas negras pelos fatores históricos que rondam os Estados Unidos, a onda de repressão sob ele se formou.

Situações como a de Wallace na NASCAR e Hamilton na Fórmula 1, geram as mesmíssimas falas: de que aqueles pilotos eram melhores e mais toleráveis quando não comentavam sobre política. Então, ao enxergar desta maneira, sim, esses pilotos estão se auto sabotando em meio ao sucesso por lutarem pelos direitos humanos. E, assim, não depende do contexto, mas sim de quem o observa.

Considerando a diferença de posicionamentos dentro do grid, o recente aposentado alemão Sebastian Vettel, em 2021 apontou a banalização da F1 sobre direitos humanos, pedindo por mais vocalidade e promoções de mudanças.

O ex-piloto da Aston Martin é um homem branco, que reconhece seus privilégios em meio ao sistema e usou sua plataforma da melhor maneira que conseguiu. E a retaliação pelos seus protestos não alcançaram metade da intensidade destinada a Lewis quando a palavra racismo surgiu.

Não existe uma competição de ativismo quando os nomes dos campeões aparecem juntos, mas sim a discrepância de reações a respeito deles. Quando Hamilton levanta uma questão, é apenas um drama, uma tentativa de chamar atenção. Quando Vettel chama atenção do sistema, então sim, é um real ativismo.

A grande diferença valorizada entre Hamilton e Vettel neste contexto é a cor da pele de cada um. O começo dos protestos contra o racismo, homofobia e machismo em países visitados pela categoria automobilística foram liderados por um piloto negro que, ainda hoje, independente de seus feitos na história, não recebe a seriedade merecida.

O ponto central deste texto é relatar que a autodestruição, auto sabotagem e qualquer termo que indique a queda de uma figura bem sucedida não amiga do sistema, nada mais é do que o medo daqueles que têm a coragem para começar sua própria briga pelos direitos básicos.

Contudo, uma atitude que o leve a se posicionar não deve ser de forma alguma baseada no medo, assim como também por implantada a ideia, quando a grande verdade é que as pessoas apenas precisam de pontos de referência.

Alguém que leve sua tese de maneira significativa e esteja se importando em verdadeiramente informar. Podemos citar Lewis Hamilton e Sebastian Vettel como forças aliadas na luta incansável pelos direitos humanos, duas frentes com suas diferenças mas unidas na composição do movimento pela conquista.

Recentemente, a figura desagradável da Red Bull, Helmut Marko, fez comentários xenofóbicos sobre um membro de sua própria equipe. Ao tentar inferiorizar Sérgio Perez pelo lugar que supostamente teria nascido, América do Sul, o conselheiro se posicionou.

Existem muitas pessoas com o mesmo estilo de pensamento que Marko e é óbvia a influência de seus privilégios em sua posição, comprovando um pouco mais que, outras pessoas fazendo o que ele fez já não estariam mais com seus empregos.

Embora seja claramente cômico que Pérez não tenha nascido na América do Sul, este foi o foco de muitas pessoas ao abordarem o assunto quando toda atenção deveria ser colocada no preconceito.

Historicamente, a comunidade automobilística menospreza posicionamentos sobre questões sociais, mas em toda sua bolha, independente do que for, havendo seu envolvimento ou não, não demoram em cobrar uma fala de Hamilton.

Não há a mesma sequência na intensidade de pressões que recaem no colo do piloto britânico em, por exemplo, nos outros dezenove pilotos do grid quando o assunto é se posicionar. Ou na equipe do próprio mexicano. Uma grande ironia é que: há toda uma comoção para cobrar um posicionamento de Lewis, mas ela desaparece quando o assunto é realmente o ouvir. E aparece novamente quando é sobre o silenciar.

A categoria de F1 ainda sofre da carência em finalmente compreender que não existe um só representante dos direitos humanos no paddock. Não existe a opção de isentar pessoas brancas, que não participam ativamente de movimentos, de expressarem suas opiniões quando coisas estão acontecendo em sua comunidade e elas demandam atenção. E, principalmente, ação.

Aos omissos, neutros, nulos e convenientes, existe algo chamado mediocridade.

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Carioca nascida na Zona Oeste do Rio de Janeiro, Laiza Villaça é uma aspirante a estudante de jornalismo de 20 anos influenciada pela cultura afro e viciada em velocidade. F1 é seu esporte favorito desde quando acordava cedo na casa de sua avó e assistia as sessões sem saber exatamente o que acontecia. Inspirada pelo realismo, propõe uma dose de desafio e reflexão em parágrafos, combinando competição e sensibilidade.

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